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quarta-feira, 1 de agosto de 2012

o desfecho de um reencontro.

Poeira na luz
(continuação)

Resolvi tomar café numa padaria perto de casa. Uma média com um pão na chapa. A falação, os aromas e o sabor me faziam lembrar os anos passados da faculdade, do começo da profissão. O saudosismo me alegrou por pouco tempo e logo precisei sair daquele lugar.

Olhava em volta em volta e pouca coisa parecia ter mudado. O tempo parecia ter parado e apenas eu não havia tomado ciência do fato. O trabalho me ofuscava a visão. Primeiro pela afirmação pessoal na carreira escolhida, depois, a busca pelo dinheiro. Aquelas ideias de riqueza não me deixavam ver que as linhas das mãos cresciam a cada dia.

Meus pés me conduziam num trajeto alheio ao meu pensamento. A mente sabia apenas das lamúrias. O café provara-se mais amargo do que o desejado. Reconheci aquela última rua. A rua da faculdade. Havia muitos anos não passava por ela. Muitas lembranças de alegria, raiva e angústia. Quando se é jovem tudo é tão dramático.

Então por que eu ainda não esqueci?

Como se o pensamento invocasse uma existência, lá estava ela, saindo da faculdade pela porta da frente. De longe parecia a mesma, tão bela quanto há uma década. Me viu e então não soube o que fazer diante de tanta alegria. Seu abraço me fez lembrar a primeira vez que a tive em meus braços.

Como tem passado? O que tem feito? Onde está morando? Já casou? Por que não? Volta sempre à faculdade? Vamos almoçar? Sim.

Antes do almoço ela tinha outras coisas para resolver. Era professora em nossa antiga faculdade e já trabalhava em seu doutoramento. Fui à barbearia, duas ruas adiante, tentar arrumar a aparência.

Barba e cabelo feitos, encontrei-a num restaurante do Centro. A conversa foi boa e aquela hora passou como se fosse um minuto. Caminhei com ela de volta à faculdade. No caminho seus braços encostavam nos meus e ríamos das histórias do passado.

Na despedida disse que deveríamos fazer isso mais vezes e concordei, sabendo que poderiam passar mais dez anos sem a ver. Trocamos cartões de visita e algo em meu olhar deve ter denunciado meu desânimo com o futuro. Disse-me que ligaria aquela noite para conversar mais, segurando em minha mão com delicada firmeza. E então soltou.

Sorri, despedi-me e ela entrou. Caminhava olhando para o chão quando senti uma mão sobre meu ombro e a pergunta: por que você sempre foi tão controlado? Beijou-me. A indescritível sensação de voltar a ser adolescente, ter a juventude fluindo nas veias. Olhou-me com brilho nos olhos e sorriu, mordendo o lábio inferior. De noite te ligo!

O resto do dia trabalhei, pois assim o tempo passava sem eu perceber. Queria a noite. Ela ligou e conversamos por quase duas horas.

Ao me deitar a luz amarela da lâmpada ainda deixava evidentes as marcas do tempo, mas com um toque o quarto foi inundado com a luz branca da Lua. Apesar da previsão do tempo afirmar o contrário, o céu estava limpo e o brilho cheio. Senti-me renovado. O tempo parecia não pesar mais sobre o corpo e as lembranças voltaram a ser doces. Acordaria na manhã seguinte novo em folha. pronto para continuar a aprender. Tomaria café da manhã na padaria em boa companhia no dia seguinte - e em muitos outros.